20/04/2007

“Um poeta”


Há sempre um homem a sós, nesta rua...
Já deves tê-lo, talvez, encontrado;
Que toda noite fica olhando a lua,
E ao se banhar de luar, sonha acordado.

Que tem um jeito estranho, um ar distante,
E não é louco, embora assim pareça...
Leva a crer, nada tem mais importante,
Que uma porção de sonhos na cabeça.

Que conversa com as estrelas e as flores,
Que explana sutilmente as maravilhas,
E faz a escuridão se encher de cores.

Faz do encanto a ocupação predileta,
Tem versos por filhos, rimas por filhas,
Não é louco nem vagabundo, é um poeta!
“O pranto e o sorriso”


Certa vez, num encontro inusitado,
O pranto e o sorriso, de repente,
Atônitos, viram-se frente a frente;
Pela primeira vez tinham se olhado.

O pranto, então, sentiu que era preciso
Revelar ali seu desagrado
Pela existência do rival, odiado...
-“Nós dois, (respondeu-lhe então o sorriso),

A lira do destino, ao léu, tangemos,
Compondo a sinfonia dos extremos;
A nos ouvir a humanidade dança...

Jamais nos sentamos à mesma mesa;
Como imitássemos a Natureza,
És a Tempestade... Eu sou a Bonança!”
“O fantasma”


Batem à porta... Quem será que está batendo?...
A estas horas, quando a rua está deserta,
Já todos dormem... quem será que me desperta,
Do sonho bom que no momento estava tendo?...

Algum mendigo, um pobre errante, vagabundo,
Talvez, faminto, tenha vindo aqui bater;
Um bêbado, algum louco, também pode ser;
Há tantos perdidos, à noite, pelo mundo!...

Fortes, cada vez mais, vão ficando as batidas;
Cada vez mais alto elas podem ser ouvidas,
E aumentam meu medo de abrir aquela porta...

Minha alma, quando o faço, nesse instante pasma,
Ao ver, claramente, que lá fora há o fantasma,
De uma felicidade há muito tempo morta!...
“A luz”


Adeus, minha ilusão, eu vou deixá-la,
E não tente me seguir, eu lhe imploro;
Repare nos meus olhos que ainda choro,
Perdido em meio à solidão da sala.

Esse meu pranto oculte, sem demora,
Junte as tristezas num canto qualquer;
Dos velhos sonhos, faça o que quiser...
Que um novo alento me sorri, lá fora.

Passar na rua, numa tarde incerta,
Pela fresta da janela entreaberta,
Eu vi, sem querer, nos olhos de alguém,

A minha sonhada felicidade...
Vou sair, procurar pela cidade,
A luz que me falta, e esses olhos têm!
“Síndrome do pânico”


Tremores, mãos geladas... de repente,
Acometidos somos, de pavor;
Uma sensação de morte iminente,
Nos enclausura em mórbido torpor.

Palpitações, taquicardia intensa,
Nesses momentos de extrema aflição,
Tornam inda mais forte a nossa crença
De que estagnar-se os batimentos vão.

Gélidos suores dos poros vão fluindo,
Vertigens, dispnéia, dores cruciais...
“-É o fim de nossa vida aos poucos, vindo!”...

A causa, nos explica a medicina:
Por entre os interstícios neuronais,
Há falta de uma tal “serotonina”!...
“Pantomimas”


Como um pintor eu fosse, renomado,
Capaz de a própria vida, numa tela,
Fielmente retratar com sua aquarela,
Eu me senti, por vezes, muito ousado.

De cores vivas, de brilhos, de flores,
Os meus quadros, repletos sempre estavam,
Que, ao vê-los, logo, todos se encantavam;
Causava inveja a todos os pintores.

“Que mãos tão hábeis, quanta sutileza!...
De revelar tão bem tanta beleza,
Só mesmo um gênio pode ser capaz!...”

Mas, só eu mesmo, o autor das obras-primas,
Conseguia entrever as pantomimas,
Das tintas, escondidas por detrás!...
“O paraíso”


Tenho em meu corpo cicatrizes fundas,
Que o látego da vida em mim deixou;
A prova cabal das constantes tundas,
Nele, inconteste, gravada ficou.

Não há quem duvide desses açoites,
Ao ver minhas chagas evidenciadas;
Testemunhando o suplício das noites;
A fúria insurgente das chibatadas.

Certo dia a Deus pedí numa prece
Que algum consolo pras dores me desse,
Que, sofrer tanto, eu já não suportava.

Ele me respondeu que era preciso,
Que pra adentrar, glorioso, o paraíso,
Despreparado, de outro modo estava!
“Nossos destinos”


Essa viagem, a vida, à qual nos convidaram,
E sequer nos permitiram dizer um não,
Naquele momento, também não nos falaram,
Que embarcávamos, tolos, no trem da ilusão.

Assim não nos contaram do nosso futuro,
Nem tampouco que o medo, conosco estaria,
Ali, ao nosso lado, num vagão escuro,
Ao longo dos trilhos da incerta ferrovia.

Por todo o percurso, entre risos, desatinos,
Vamos indo ao encontro dos nossos destinos,
Que, numa estação qualquer, nos farão descer.

Alegres ou tristonhos, desembarcaremos,
E, novamente, não, dizer não poderemos...
Por vezes, nem adeus nos deixarão dizer!
“O exato momento”


De verso em verso, rima em rima, vou,
A rir de mim mesmo, a vangloriar-me;
Chorando, feliz, tentando encontrar-me,
Que ali, bem no meio, por certo estou.

Por horas e horas, por noites e dias,
Sem ter descanso, nessa busca insana,
À minh’alma aflita faz crer, engana,
Um misto de horrores e fantasias.

Há tantos caminhos se abrindo à frente,
E num deles me encontro certamente,
Mas nunca eu sei por qual devo seguir.

E vivo a temer o exato momento
Desse encontro de mim, que às vezes tento,
De repente, os meus passos impedir!
“Aos anjos”

P: Jackson

Jamais olvidaremos tua alegria,
De tuas virtudes, sempre lembraremos;
Tua alma pura será nossa guia,
E à luz dela, seguros viveremos.

E nunca, aos anjos, que te transportaram,
Novamente ao convívio celestial,
Diremos, de alguma forma, que erraram,
Se percebemos, todos, afinal:

Em nosso mundo de sombras e horrores,
De muitos espinhos e poucas flores,
Mesmo que tão pouco nele ficaste,

Desempenhaste tão bem teu papel,
Que a saudade que entre nós tu deixaste,
Certo, deixaste, também lá no céu!...
“O balanço”


Da minha janela vejo um balanço,
Por entre as sombras do jardim, silente;
Que, baloiçando ao vento, num remanso,
Trouxe-me de volta a infância, contente;

Em que nele passava horas inteiras,
Sem pensar em nada, sempre sorrindo;
Sem saber que as glórias são passageiras,
Naquele suave passeio, indo e vindo.

E quando alguém me fazia ir bem alto,
Lembro meu coração, em sobressalto,
De grande felicidade pulsava...

E pensei, certa vez, quando descia,
Que ao balanço, a vida se parecia,
Pois, tão pouco, lá em cima me deixava!...
“Meu mundo”


As horas se sucedem, vagarosas,
Sem trazer-me encantos, mesmo um sorriso,
Sem palavras amigas, generosas,
Meu mundo é vago, estranho, impreciso.

Triste, mudo, de indefinidas cores,
Tem paisagens cinzentas, desbotadas;
Meu mundo não tem jardins, nem tem flores;
Soturno, um céu de estrelas apagadas.

Vejo ao meu lado mundos tão brilhantes,
Tão diferentes, tão encantadores,
Que invejo a sorte de quem neles mora...

Ah, se eu pudesse, ao menos por instantes,
Em suas correntes fartas de esplendores,
Banhar minh’alma que em meu mundo chora!
“O jardim....a flor...”


Da minha janela avisto o jardim;
Quietas dormitam, no silêncio, as flores;
Num sono leve, pleno de esplendores,
Vibram, se exaltam, se lembram de mim!

Que as amo, todas sabem, certamente,
Pois cada noite venho visitá-las;
Como ninguém, só eu consigo amá-las;
Triste ou risonho, sempre estou presente!

Confesso, às vezes, me causam espanto!...
Aquela flor pequenina, num canto,
Pasmem!... certa vez ouví, suplicando:

-“Não deixes de vir aqui... me dizia;
Nem imaginas a enorme euforia,
Que nós sentimos ao ver-te chegando!...”
“O tempo”


À beira do abismo, desassistidas,
De amor, de brio, de honra, assaz carentes,
Estão as almas, estão nossas vidas,
Sob o jugo cruel dos indolentes.

A passos largos, sobre nós avança,
A sombra caliginosa da morte...
Ceifando, insensata, nossa esperança,
Entregues que estamos à própria sorte!

No negro lamaçal da impudicícia,
No antro da intolerância, da sevícia,
Proliferam os maus e inconseqüentes.

Enquanto meio ao silêncio, implacável,
O tempo se aproxima, inexorável...
Tempo de choro e de ranger de dentes!...
“As flores”


Flores do campo, flores dos jardins,
Divinas, perfumadas, coloridas;
São rosas, miosótis, são jasmins,
Petúnias, gerânios e margaridas.

São crisântemos, são manjericões,
Lírios, glicínias, alegres, formais;
Presentes na morte, e nas paixões,
Charmosas, olentes, passionais.

Azaléias, malmequeres, camélias
Damas-da-noite, acácias, são bromélias,
São madressilvas, girassóis e palmas.

Ao longo de nossas vidas as vemos,
Nas alegrias, tristezas, extremos,
Regendo as emoções de nossas almas.
“Meus sonhos”

Para: Thayse


Sei que tão longe estás de mim, agora;
Não sabes o quanto te quero aqui, comigo,
Meu coração, conturbado, triste chora;
Ele que, eternamente, é o teu abrigo.

Meus braços sentem tua falta e te procuram,
Alucinadamente em sonhos que a noite traz,
Onde a minha voz e a tua se misturam,
Como se fora um canto uníssono de paz.

Eu me esforço pra tornar o mais possível,
Beijar teu rosto num momento inesquecível,
Seguindo-te em meus sonhos, passo a passo.

E foi assim que eu descobri, que na verdade,
Agradam-me mais meus sonhos que a realidade,
Pois neles, as noites todas, eu te abraço!

14/04/2007

Dinheiro
Prata, falépia, cobre, vil metal!...
Arame, gaita, cascalho, capim...
Pila, jabaculê, pilimpilim,
Grana, pecúnia, mufunfa, cacau.

Parneque, jibungo, verba, vintém,
Níquel, numerário, zergulho, algum,
Nota, pataca, pecúnia, tuncum,
Bazaruco, marcaureles, cuprém.

É o dinheiro... com tantos apelidos!...
Esdrúxulos, alguns... alguns são feios;
Também há sérios, e outros, divertidos.

Muitos não tem nenhum, outros tem "rios"...
Só tenho esses meus versos, dele, cheios;
Meus bolsos, já faz tempo, andam vazios!...

09/04/2007

Renasce o glorioso... é tricolor!

"Renasce o glorioso, é tricolor/ alegre mais se torna esta cidade/ em todos os gramados por onde ele passar/ felizes torcedores vão contar/ as glórias desse herói tricampeão/ 71, 72, 73/ vencer é sua meta/ a sua tradição/ o Alegrense vive em nosso coração... O vermelho simboliza a sua garra sem par/ no amarelo a destreza do seu time se traduz/ no azul a confiança da torcida a iluminar/ o caminho que às vitórias o conduz..." (Letra e música de Luiz Alberto Valadão de Azeredo).
A festa do Alegrense na vitória por 3X1 sobre o Serra, que garantiu o título antecipado de campeão capixaba, levou o povo da cidade para as ruas.
O time do Alegrense Futebol Clube, logo ao nascer, se tornou tricampeão - em 71/72/73 -, da Liga Serrana, antigo campeonato do sul do Estado. Depois, passou por problemas financeiros, fechou, e voltou ano passado, vencendo a 2ª divisão e ganhando o direito de disputar o Campeonato Capixaba. Vencendo o Serra em históricos 3 x 1, com dois gols de Admílson e um de Éldio, no Estádio Benedito Leão. E deixando o povo alegrense no maior alto astral, cores, sons e rebolado tomando as ruas, desde a manhãzinha.
Quem conta a história do Alegrense é o diretor e primeiro secretário do clube, Venilton Santos, engenheiro agrônomo há 19 anos, professor do Centro de Ciências Agrárias da Ufes, de Climatologia Agrícola, e apaixonado por futebol e pela cidade. Até o jeito de falar dele é emocionado, e quando conta que foi o vocalista (ele toca violão e canta também) na gravação do Hino do Alegrense, ao lado dos músicos Luiz Alberto (o autor), José Renato e Pitico, aí ele só falta chorar. A conversa foi antes do jogo, naquela expectativa angustiante de uma vitória quase certa sobre o Serra.

(Extraído da revista "Século"(Junho/2001 - nº 16)(Vitória-ES)).

08/04/2007

“Quem?...”


Quem poderá socorrer meu coração aflito,
Meio à solidão que, impiedosa, o desencanta;
De onde virão forças pra sufocar meu grito
Contido a todo custo, latente, na garganta;

De quais recantos desse mundo virão as luzes,
Pra dissipar com vigor, de vez, a névoa densa
Pontilhada de abismos imensos e feias cruzes,
Por esses meus caminhos de algia e descrença;

Quem poderá conter a fúria insana dos ventos,
Quando despencarem pesadamente os temporais
Enclausurados em mim, em forma de pensamentos;

E quem saberá apontar a direção, a mais segura,
Para os meus passos lentos, quase irracionais,
Pela trilha inevitável, inexorável, da loucura?...
“Dueto”


Vivo tangendo a minha velha lira...
E nas cordas rotas, enferrujadas,
Entre acordes, notas desafinadas,
A minh’alma canta, sofre, suspira...

Na morbidez dos gestos estiolados,
Sempre mais baixo, a velha lira soa;
Então, mais forte ainda, a alma entoa,
A sinfonia dos abandonados.

Noite adentro, no estranhíssimo dueto,
Num patético, impreciso minueto,
A lira, enfim, parece silenciar.

E mesmo se ela, de todo emudece,
Como se a plangência dela, tivesse,
Minh’alma segue sozinha a cantar!
“O palco”


A vida é um grande palco, na verdade,
Onde vamos todos, representando
Cenas amargas... de felicidade...
Uma platéia, atenta, nos olhando.

E nele, cada qual tem seu papel;
Logo ao nascer, já dentro d’alma o traz...
Misturam-se às vezes inferno e céu,
Há gritos de guerra e há cantos de paz.

Imensas trupes, bons e maus atores,
Encenam estórias de pranto e riso...
São heróis, vilões, escravos, senhores.

E quantas vezes, num gesto insensato,
Fechando as cortinas sem um aviso,
A morte surge, no meio de um ato!...
“As esperanças”


Por mil desesperanças vou vagar,
Incontáveis quedas hei de sofrer;
Mas minh’alma há de sempre continuar,
E assim, por certo, um dia há de vencer.

Um dia, há de zombar dos meus fracassos,
Dos meus erros, da minha triste sorte;
Há de seguir, por certo, os mesmos passos,
Determinada, mesmo após a morte.

Há de fazer florir meus ideais,
Além de todas as terrenas normas,
Mesmo que, vida, não exista mais.

Há de cantar a mais bela canção,
Há de exaltar, das mais diversas formas,
As esperanças do meu coração!...
“As paredes”


Vivo premido entre espessas paredes,
E sinto esmagar-me, completamente;
No meio delas, de mim, pouco vedes,
Tampouco ouvís minha voz insistente,

Que clama por socorro, aparvalhada,
Permeada de ininteligíveis ruídos...
Mal percebeis, da garganta estreitada,
Entre estertores, meus débeis gemidos.
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Grande silêncio impera, de repente...
As paredes se juntam, finalmente,
Com meu corpo nelas aprisionado.

Ao ver, do que fui, só restando
Vísceras, sangue, da fenda brotando,
A minh’alma chora, tristonha, ao lado!
“Tormento”


Alma, consigo, este tormento guarde,
A quem quer que seja, nunca o revele;
Não fale agora, nem depois, mais tarde,
Nem mesmo quando o sinto à flor da pele,

Do teu domínio, tentando evadir-se,
Buscando entre os poros, a porta aberta;
À minha transpiração, imiscuir-se
Não permita; esteja, pois, sempre alerta.

Não deixe que ele alcance-me a garganta,
Rígida, reprima a ousadia, tanta,
De nela ensaiar um grito de dor.

Pois se ele escapa, no suor ou na voz,
O mundo inteiro vai chorar por nós,
Vai morrer de pena a cada estertor!
Exércitos”


Ouço tropéis na noite calma, silenciosa,
Pressinto exércitos de mim se aproximando;
Deles eu posso ouvir a marcha rumorosa,
Os seus gritos de guerra, na amplidão ecoando.

O que eles pretendem, fazer-me prisioneiro,
À fétidas masmorras, lançar-me, talvez?
Ou, então atirar-me ao leito derradeiro,
Álgido da morte, quem sabe, de uma vez?...

Talvez se compadeçam, vendo-me tão triste,
Que, denodado, meu frágil corpo resiste,
Ao extremor inconsolável da paixão.

Talvez entendam que já cumpro dura pena,
A que a própria vida, implacável, me condena,
E baixem as armas, num gesto de perdão!
“Anjos”


Hão de vir dos céus flamas de ventura;
Divina piedade do alto há de vir;
Hão de vir anjos cheios de ternura;
Já, claramente, os posso pressentir.

E virão sobre as nuvens, majestosos,
Purificando os males, nossas dores;
Da pompa celeste virão gloriosos,
Iluminados em seus esplendores.

Pra redimir-nos, pra nos consolar,
Hão de estar entre nós, onipresentes,
A qualquer momento, em qualquer lugar.

Pois, sem que peçamos, Deus nos envia,
Ao ver nossas almas de amor carentes,
Seus anjos pra ajudar-nos, todo dia!...
“In memoriam”

“Homenagem póstuma a
Virgílio Valladão Flores”.
(1892/1977)


O velho coração parou, e à despedida,
Restaram indeléveis marcas de uma vida;
Um vasto espelho de virtudes, áurea messe,
Trilha de luz, que acesa, intensa permanece.

No riso, na dor, no encontro e na procura,
Foi sempre a mesma inigualável criatura,
Solícito e afável, tenaz, decidido;
Do bem, a cada gesto, um senso desmedido.

E eis que a morte, pertinaz e insensata,
Em golpes rudes, austeros e incessantes,
A vida desse justo aos poucos arrebata!

Que Deus a ele dê o sol da eternidade,
A iluminar a cada um de nós, distantes,
Na bruma fria e dolorosa da saudade!
“Tempo e conta”

(Parodiando!...) “Conta e tempo” de: Frei Antônio das Chagas(1631/1682)


Fiz tanta conta, e fiz por tanto tempo,
Gastei muito tempo, foi tanta conta!...
Que me sobrou conta, faltou-me tempo,
Pra do passar do tempo eu me dar conta!

Pra conta que resta eu procuro um tempo;
Da falta de tempo, eu jamais fiz conta!...
Que, ao resto da conta, eu vou dar um tempo:
De tempo em tempo, contar cada conta.

Algo me conta que num dado tempo,
Hei de achar tempo, de tudo dar conta,
E fazer de tal conta, um passatempo.

Mas se com o tempo, surgir outra conta,
Será tanta conta, em tão pouco tempo,
Que nem todo o meu tempo vai dar conta!...

07/04/2007

“Satisfação”


Não faço versos por acaso, amigo,
Devo explicar-lhe, porque sou assim;
Fique sabendo, neles, o que eu digo,
É o coração que dita para mim.

E exige que os escreva sem demora,
Que mostre a todos o que está sentindo;
E que os declame, como eu faço agora,
Sem se importar se existe alguém ouvindo.

Pois, desta forma, se torna mais leve...
Exteriorando amores e amarguras,
Em cada um, que a minha mão escreve.

De ser poeta, não tenho a pretensão,
Se esta é a resposta por que tu procuras,
Acabo de lhe dar satisfação!...
“ De um tempo”



Eu sou de um tempo em que era lícito se amar,
De um tempo em que os casais andavam de mãos dadas;
Em que nas serenatas, nas noites de luar,
Levávamos flores às nossas namoradas...

Falar de amor, a nossa face enrubescia,
Naquele tempo que se que foi pra não voltar!...
Dizíamos: - Te amo!... me lembro, todo dia;
Era tanta emoção brilhando em nosso olhar!...

Que bom seria, se voltasse um tempo assim...
Trazendo consigo as juras de amor sem fim;
Despertando a velha ternura, adormecida;

Com toda aquela pureza de antigamente,
Que aflorando, encantava, de súbito, a gente,
E que hoje, dos corações, anda tão sumida!...
“O maldizente” (Glote ferina)


Ó “língua de palmo”, tanto mal tu nos fazes,
Que não podes nem supor os imensos danos
Deste afã rotineiro de levas-e-trazes,
Dos teus atos impensados e desumanos!

E todos os dias há tantos infelizes,
Com essa tua logorréia inconseqüente,
Que penso muitas vezes acerca do que dizes:
Se o fazes com malícia, ou mesmo se és demente!...

E vendo-te passar, um cirurgião me vejo,
Bisturi sempre à mão, em riste, reluzente,
E incisar-te, afoito, tresloucado, desejo.

Eu então me imagino orgulhoso demais,
Decepando feliz a tua língua insolente,
Prazeroso a extirpar as tuas cordas vocais!...
“Vitae... Mortis... Verbum!”


Nascer!... sonhar, sofrer, sorrir, chorar,
Subir, descer, cantar, ganhar, perder,
Falar, mentir, provar, crescer, amar,
Partir, voltar, lutar, plantar, colher.

Entrar, sair, perdoar, chegar, não ir,
Comer, beber, dançar, pedir, doar,
Buscar, faltar, pensar, poder, dormir,
Querer, contar, achar, fugir, se dar.

Comprar, vender, pagar, levar, trazer,
Rever, durar, sentir, cortar, reunir,
Bater, matar, forçar, soltar, prender,

Rimar, tomar, velar, medir, prever,
Somar, tirar, correr, andar, premir,
Suar, molhar, secar, cansar... morrer!...
“Ingenuamente”


Ó jovem, que tanto ris do meu rosto,
Ao vê-lo franzido, ao peso dos anos;
Tudo que viví, nele eu trago exposto:
Todos os acertos, tantos enganos.

Das minhas carquilhas, tu fazes troça,
Desavisado, no teu alvoroço...
Tê-las, talvez, o teu rosto nem possa;
A morte pode levar-te ainda moço!

Na taça do destino, rindo assim,
A nutrir tanto desprezo por mim,
Instilas teu veneno, e dele bebes;

O meu passado é hoje o teu presente...
E nele estás a rir, ingenuamente,
Do teu próprio futuro e não percebes!
“O verdadeiro amor”



Emoldurado por etéreo encanto,
O verdadeiro amor não se arrefece;
Envolve o coração num terno manto,
E pelos tempos nele permanece.

Vive ali, numa sublime existência,
E estende às nossas almas o aposento;
Se fora, muda a física aparência,
Por dentro, em nada muda o sentimento.

Um dia, idoso, me darás razão,
Verás que há o mesmo brilho na emoção,
Hoje ou amanhã, parecerá o primeiro.

Se tu tiveres sorte, certamente,
Pois Deus, ao repartir o amor pra gente,
Deu pra bem poucos um que é verdadeiro!
“Parabéns”

Aos teus “dezoito mil duzentos e cinqüenta”,
Somas hoje “trezentos e sessenta e cinco”;
À primeira vista, essa conta representa,
Um fio de cabelo branco a mais, mais um vinco.

Aqui nós estamos, a dar-te os parabéns,
Não só pelos dias que somas à tua idade;
Vê-se, por fora, imperfeições a mais, tu tens,
Mas por dentro, no entanto, tens mais qualidade.

Neste mais de meio século, te apuraste...
Nunca te mires no espelho qual velho traste,
Porque, saibas, tua alma, com notável afinco,

Seguiu somando, incansável, mais experiência
Àquele tempo tão remoto, o da imprudência:
“Cinco mil quatrocentos e setenta e cinco”!
“Minha Terra” Ó minha terra, humilde e venturosa, Não podem teus filhos nunca olvidar-te; Pois apesar de modesta, és formosa; Nos sonhos deles, desfilas com arte. Alto, das serras, vigias seus passos Nas veredas que a vida ofereceu; Choras, se um deles, se perde em fracassos; Te ufanas e vibras se outro venceu. Por mais que se afastem, um dia virão; Quem viste nascer, jamais te despreza; Vencidos, felizes, todos rezarão. E a sós, para Deus, pedirão só por ti, Falarão para sempre, em toda reza, Da emoção de ter nascido aqui!
“Num jardim qualquer”


Pranteando as companheiras, tantas, saudosas,
Enlaçadas em buquês e murchando aos poucos,
Sussurram as dálias, em sons débeis e roucos,
Causando espanto às begônias curiosas.

Por todo o jardim, vários grupos se divisa...
Avistam-se lírios, febrís e ostentosos,
Enquanto outros, discretos e preguiçosos,
Entregam-se aos suaves embalos da brisa.

Vejo orquídeas, exibindo-se às outras flores,
Deixando meio ao festival de fartas cores,
Enciumado, um vaidoso malmequer.

Gerânios brotam, cantam vivas estridentes
Às rosas, rainhas, altivas e imponentes,
No silêncio dos canteiros...num jardim qualquer!
“A Velhice”


Quanta gente há por aí, que fingindo diz,
Ser a velhice pra elas uma ilusão;
Mesmo se o rosto tem vincos, traços senís,
E esbranquiçados cabelos em profusão.

Ilusão é tentar se esquivar da verdade,
Dizendo que o tempo, só para outros passa;
Tolos se enganam, burlando a realidade;
Contra o destino não cabe qualquer trapaça!

E levam eles assim a vida, mentindo,
Querendo provar um vigor que já não têm;
Confessar a idade, é certo, não lhes convém!

Passam os anos... Um passa, e outro vem vindo;
E nem a velhice, implacável, os torna francos,
Mesmo quando há só rugas, e cabelos brancos!
“A vida eterna”


Aos céus, minh’alma, há de ascender gloriosamente,
No exato instante do meu último suspiro;
Alcandorada, silenciosa, resplendente,
Há de exilar-se, eternamente, em seu retiro.

E lá, bem junto a Deus, na celestial morada,
Ao som de saltérios, coros angelicais,
Da glória Dele, fartamente iluminada,
Há de sublimar-se, por certo, sempre mais.

Há de atingir a plenitude, o bem supremo,
E receber das mãos do Pai, em gozo extremo:
A vida eterna – dos justos, o galardão.

Aos seres de alma pura, a dádiva divina,
Pois, à morte deles, a vida não termina,
Vai encontrar nos altos céus sua extensão!
“As manhãs”


Acorda, meu amor, vem ver a aurora,
Tingindo os céus, a natureza inteira;
Mas venhas logo, que ela vai-se embora,
Na sua pressa diária, costumeira.

Vem ver a rósea, rútila, aquarela,
Que antes de si, pra nós o sol envia;
Repara a noite, agonizando nela,
Abrindo as portas para um novo dia.

Vamos, levanta, e vem ver as estrelas;
Se te demoras, podes não mais vê-las
Se despedindo aos poucos, tremulantes...

...As manhãs... ah! como eu me encanto delas,
Que, alegre, corro pra abrir as janelas,
E, a cada vez, mais encantado que antes!
“Quem sabe, um dia...”

Eu quero proclamar, solene, à humanidade,
A firme crença nos homens, na inteligência,
A fé no trabalho, na honra, e na verdade,
E na altivez dos propósitos da ciência.

Eu quero demonstrar, solene, à humanidade,
A falsidade das mais vís ideologias,
O derrotismo, a castração da liberdade,
Toda a desesperança das almas vazias.

Eu quero proclamar, solene, em viva voz,
Os belos gestos de amor e a fraternidade,
Tão fracos e ausentes em muitos de nós.

Eu quero abominar, solene, a hipocrisia,
O ódio, a insensatez, toda leviandade,
E juntos proclamar a paz, quem sabe, um dia!...
“Todos se cuidem” As rugas tomaram, insolentes, meu rosto, Sem que eu pudesse ao menos pensar em detê-las; O tempo implacável, dia a dia as tem posto, E diante do espelho, sempre a mais posso vê-las. A pele fina e lisa dos tempos de outrora, Perdeu-se na ilusão da eterna mocidade; Já não tem mais viço, nem tem mais brilho agora, Mas segue as mudanças impostas pela idade. Pra todo ser vivente, vale a mesma norma, Animais e homens na mesma direção; A velhice é pra todos, tudo se transforma. Não há como impedir alguém de que envelheça, Mas todos se cuidem, com máxima atenção, Pra que o espírito sempre jovem permaneça!
“Velhas folhas”


O vento travesso brinca nas folhagens
Das sóbrias figueiras, num canto do jardim;
Traquinas, murmura, e descreve as imagens,
Que os olhos vão trazendo com graça pra mim.

Fico olhando as folhas na relva caindo,
Bailando no espaço, pra enfim se deitarem;
Velhas folhas sabem, as jovens vêm vindo,
Pra logo, como elas, no alto brilharem.

Pessoam passam, e vão e vem, e as pisam,
Todos os dias pelo chão, sem entender,
Que as foscas folhas tristemente agonizam.

Tristezas mudas, sem pranto, nem lamento...
Centenas, milhares, vão sem perceber,
Que nas folhagens, travesso... brinca o vento!
“Senhor, escutai a nossa prece!”


Em favor da paz, e da fé que desvanece,
Ante a vossa presença estamos, de joelhos,
Com a dor estampada nos olhos vermelhos,
Rogamos: "-Senhor, escutai a nossa prece!"

Em prol da justiça, do amor que se arrefece,
Pelo fim da ignomínia, dos falsos profetas,
Das ações desumanas, cruéis, incorretas,
Rogamos: "-Senhor, escutai a nossa prece!"

Em nome da infância, desprotegida e nua,
Dos labirintos e abismos negros da rua,
Daquele que vigia, e de vós não se esquece;

Pelo bem da honra, dos justos, da igualdade,
Nós, os pecadores, em toda a humanidade,
Rogamos: "-Senhor!... escutai a nossa prece”!
“Pesadelo”


Os pútridos pântanos bafejam seus miasmas;
Vetustas harpias volitam no negror;
Em meio a palores espectrais de fantasmas,
Sombrios corais ensaiam árias de horror.

Pela noite macabra, em seus nefandos passos,
Thánatos e corte, ensandecidos caminham;
Horrendas aquarelas de sangrentos traços,
Tingem quando avançam, pelo seu rastro apinham.

Gritos de dor, lancinantes, rasgam os ares;
O pavor se alastra, e por todos os lugares,
Lamúrias e gemidos, na noite se escuta.

Segue-se a madrugada, ensangüentada e lenta,
Até que a própria noite expira, sonolenta;
--------------------------------------------------------
Pesadelo findo, desperto, e vou à luta!
“À espera”



Por longínquas sendas minha alma vaga...
Vai à procura de mim, do meu eu;
Tudo de bom que eu tinha e se perdeu,
Fico esperando que ao voltar me traga.

Os meus amores, meu sorriso, a paz
Que dela se evadiu tão de repente...
O que melhor eu tinha e fez-se ausente,
Talvez, na volta, ela consigo traz!...

Daqui, fico torcendo ansiosamente
Pra que ela volte logo, urgentemente...
Que eu não suporto mais... é tanta espera!...

Não posso fazer nada, aqui distante,
Resta-me rezar, e o faço bastante...
Pudesse eu ajudá-la... ah, quem me dera!...
"Mais um soneto"



Desilusões... são tantas... já perdi a conta;
Tenebrosos abismos, tortuosas estradas,
Por onde caminham comigo, de mãos dadas,
Um coração incompetente e uma alma tonta.

E vendo-nos passar, há quem se compadeça;
Há quem nos estenda a mão, solidariamente;
Há quem sofra ao ver as quedas e se ofereça,
Pra nos levantar, nos por de pé novamente.

Às vezes, algo acontece, que nos consola;
Sob os auspícios de uma lágrima que rola
Sem pudor algum, sem receios, pela face,

Simbolizando uma esperança a mais que morre,
A mão amiga pega a pena e nos socorre,
Faz da dor, poesia... mais um soneto nasce!....

06/04/2007

“Correções”


Mais um soneto, enfim, mais um desenho,
Da minha pobre alma sobre o papel;
À cada desilusão, eu me empenho,
A fazer da minha pena um pincel.

E vou esboçando aos poucos a dor,
Oculto as lágrimas nas entrelinhas;
Às vezes mudo as palavras, a cor,
Dos dois tercetos, das duas quadrinhas.

Pois minha alma, às vezes, de tão confusa,
A ditar a verdade se recusa,
E frases insinceras vão surgindo.

Depois se arrepende, e tudo revela,
E a mão, se rendendo aos caprichos dela,
Segue paciente os versos corrigindo!...
“Alternância”


Olho o relógio: meia-noite e meia!...
Meus versos espera, a pálida tela...
Que aos poucos irão se inserindo nela,
Deixando-a de lágrimas, risos, cheia...

É assim todas as noites, é rotina...
A minha alma, às vezes, no início, chora,
Depois, perto do fim, já comemora;
Noutras, vai sorrindo... e a chorar termina.

Todos os meus sonetos são desenhos,
Dos seus imprevisíveis desempenhos,
Em meio à uma emoção itinerante.

Ao fim de cada leitura se nota,
Que sempre, uma vitória e uma derrota,
Lá vivem se alternando a todo instante!

05/04/2007

“Almir, o pequeno anjo”



Um anjo esteve entre nós, chamava-se Almir...
Ficou por pouco tempo... deixou-nos saudade!...
Um ano e nove meses, de felicidade,
Ele nos deu de presente, nos fez sorrir.

A um belo canto, suave, qual de um passarinho,
Se parecia sua voz, e nos encantava...
Havia encanto em tudo que esse anjo falava,
Em qualquer tom que fosse, se alto, se baixinho.

No rostinho meigo, um sorriso cativante,
Que nos animava sempre a seguir adiante,
Nossa auto-estima, com vigor, recrudescia...

Vive a sorrir entre os anjos, no céu, agora,
Nas nossas lembranças, em nossa alma que chora,
Esse anjo de voz doce, que entre nós sorria!...
“Meu Reino”

Sou rei coroado, senhor de um castelo,
Encravado nas montanhas, deslumbrante,
De esguios torreões, suntuoso e belo;
Meu cetro é dourado, e a coroa brilhante.

Súditos fiéis, milhares, me veneram;
Meu reinado é profícuo e repleto de paz ;
Violência e miséria aqui não imperam,
Boas novas somente, meu arauto me traz.

Minha esposa, rainha, linda e elegante;
Amor não me falta, à noite ou de dia;
Nos ares reais se respira a magia!

Um reino feliz, para um rei triunfante!...
-------------------------------------------------
O relógio desperta, acordo aturdido,
Se não me apressar, posso ser despedido!
“Seres da Noite”


O dia agoniza, e a noite desce, funesta,...
Paisagens dormitam, insólitas e obscuras...
Enquanto nas clareiras da densa floresta,
Passeiam execráveis e abjetas criaturas!...

Seres incontáveis, grotescos, multiformes,
Das entranhas da terra brotam, tenebrosos...
Treme o chão, e ouvem-se estrépitos enormes,
Ao desfilar macabro de ogros asquerosos!...

Intumescida, a lua, a invadir as alfombras,
Os entes noturnos, atônita, revela;
Pasmada, involuntária, a projetar suas sombras!...
------------------------------------------------------------
É dia!... Vão-se os pavorosos personagens...
Mas voltarão quando o sol levar sua aquarela,
E as trevas, de novo, engolirem as paisagens!...
“A Nave”


No céu claro e silente, eclodem mil fulgores,
Matizes iridescentes a emoldurar-te...
E rumo à tela magistral de luz e cores,
A esplêndida nave azul dos meus sonhos parte!

Miríades de estrelas vibram, colossais,
No pulso intenso dos quasares silenciosos,
Guiando-me por entre a imensidão de astrais,
Na calma rota de caminhos luminosos!

No esplendor celeste deixam teu nome escrito...
E vão seguindo a nave, espargindo, zelosas,
Feéricas luminâncias pelo infinito!

Guizos rangem!... Douradas portas vão se abrindo...
E as filas de estelares curvam-se, orgulhosas,
Ao ver teu vulto, que a nave adentra sorrindo!
“O banquete dos vermes”



Sob a negra lápide um corpo jaz;
Apodrenta-se, oculta, a carne fria...
Dos vermes, logo, um exército edaz,
Um banquete macabro principia.

Numa voracidade desmedida,
Vai consumindo toda a massa inerte;
Por sobre a lauta vianda oferecida,
A horda, ensandecida, se diverte.

Na calma do cemitério, às escuras,
Na barbárie das imundas criaturas,
Há um mórbido espetáculo de horror...
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Para as vaidades, que vale o pendor,
Se estaremos todos, um dia, inermes,
Saciando o apetite brutal dos vermes?...
"Uma noite de seresta"

Uma noite de seresta,
Pra nós é uma noite de festa,
De incomparável beleza.
E, já não é mais surpresa,
Quando em trajes de princesa,
Às vezes, a própria lua,
Desce dos céus pra rua,
Querendo cantar também.
E sempre acontece, o passado,
Em tantas canções, revelado,
Por nós, nessa noite, procura...
No curto instante que dura,
Essa aura de ventura,
Que toda seresta tem.

Uma noite de seresta,
Às nossas almas empresta,
Indescritível leveza.
Que uma possível tristeza,
Se despede, com certeza,
Sentindo que a felicidade
Se espalha por toda a cidade,
Do coração de alguém.
No bandolim, e no violão,
Vibrando, uma forte emoção,
À nossa voz se mistura...
No curto instante que dura,
Essa aura de ventura,
Que toda seresta tem.

Uma noite de seresta,
É apenas um pouco que resta,
De uma autêntica poesia.
Que era alegre todo dia,
E vai virar monotonia;
Vai morrer aos poucos, sem graça,
Se, à medida que o tempo passa,
Não lhe cede a voz, ninguém...
Mas aqui, há de brilhar,
Nós iremos sempre exaltar,
Sua ímpar formosura...
No curto instante que dura,
Essa aura de ventura,
Que toda seresta tem!
Ser seresteiro”

É um privilégio ser seresteiro,
Cantar de Janeiro a Janeiro,
As canções de amor mais belas.
No meio da praça, na rua,
Sob os olhares da lua,
Ou embaixo das janelas.

Das estrelas, em companhia,
Vive a alegre confraria,
Quando é noite, o ano inteiro.
E com notável constância,
Vêm as lembranças da infância,
Saudades do amor primeiro.

É uma virtude ser seresteiro,
Cantar de modo altaneiro,
Na voz, tendo o coração.
Bem alto, ou até murmurando,
Seguir sorrindo, cantando,
Zombando da solidão.

Ser seresteiro é ser dono,
Nas noites em claro, sem sono,
Das chaves da ilusão.
É seguir pela vida ensinando,
Em naus de versos, navegando,
Os mistérios da paixão!

Que felicidade, é ser seresteiro,
É como ser jardineiro,
Plantando canções por aí.
É uma missão, e é mais linda,
É muito mais, creio, ainda,
Que tudo que eu disse aqui!
“Hino do Alegrense F. C.”



Renasce o glorioso, é tricolor;
Alegre mais se torna esta cidade.
Em todos os gramados, por onde ele passar,
Felizes torcedores vão contar.
As glórias desse herói tricampeão,
71, 72, 73.
Vencer é sua meta, a sua tradição;
O Alegrense vive em nosso coração.

O vermelho simboliza sua garra sem par,
No amarelo a destreza do seu time se traduz;
No azul a confiança da torcida a iluminar,
O caminho que às vitórias o conduz.
"Armagedom"
(Finalista do XXII FAMA - Alegre - ES)

Introdução: (D D#º C#m7 F#7 Bm7 E7 A7/9) (D D#º C#m7 F#7 Bm7 E7 F7+ Bb7+ A7+)



A7+ A#º Bm7
Oh, quem diria, ai meu Deus, epidemia
G#m7/5- C#7/9- F#m7 (A7)
Um surto grave de crescente hipocrisia
D D#º C#m7 (F#7)
Farrapos vivos pelas ruas da cidade
B7/9 E7/9
Comendo a sobra que lhes deixa a burguesia.
A7+ A#º Bm7
A violência usurpando a liberdade
G#m7/5- C#7/9- F#m7 (A7)
Homens correndo alucinados pro futuro
D D#º C#m7 (F#7)
Tragédia, farsa, ou comédia, o que se passa
Bm7 E7 A7+
Em toda parte, com o palco no escuro.
G#m7/5- C#7/9- F#m7
Flutua o dólar, cai o muro, a vida é cara
D D#º C#m7
O imposto assusta, o leão! Mas quem declara?...
G#m7/5- C#7/9- F#m7
Maracutaias, se misturam terno e saias
G#7 C#7
Nessa folia, oh, quem diria, desvairada.
G#m7/5- C#7/9- F#m7
A classe alta, a “dolce vita”, nem se importa
D D#º C#m7
Se a barragem pouco a pouco abre a comporta
G#m7/5- C#7/9- F#m7
Jorrando o sangue e o suor dos miseráveis
Bm7 E7 A7+
Que suplicantes, por um pão, batem à porta.

(Introdução)
(A harmonização da 2ª parte é idêntica à da 1ª)

Fala-se em planos, em reformas sociais
Fala-se em glória a quem não tem mais ideais
Enquanto os sonhos vão morrendo de overdose
De negligência, morrem gente e hospitais.
A cada dia um cidadão se diz vidente
Logo aparece nas tevês e nos jornais
Cria moedas, cria planos irreais
Como se a massa fosse estúpida ou demente.

O Armagedom já se desenha em nossa mesa
Graças ao “gênio” dos arautos da incerteza
Sinais dos tempos, do som forte das trombetas
Anunciando a justiça que há de vir.
Do sol, de outros planetas, dos cometas
Que venha o fogo nossos erros consumir
Purificando o fundo imundo das sarjetas
E a nós mortais, enfim nos possa redimir.

(Introdução)
“Ontem à tarde...”
(Classificado em 2º lugar no "V Concurso Newton Braga de Poemas", em nível nacional, em 2006)

Ontem à tarde um Jasmim falou-me assim: “-A Margarida anda sumida do jardim!... A ví aos beijos com um Lírio, que martírio... Eu que sonhava essa ventura só pra mim! Eu vi a Rosa, tão airosa, toda prosa, “Fazendo graça”, lá na praça, pra quem passa; A Samambaia vive encurtando a saia... Que despautério!... esse lugar já foi mais sério!... Que houve com as flores, antes tão discretas, Tão sem pudores, tão irrequietas?... Quando é tarde, a noite vem, “pés de veludo”, No escurinho fazem tudo que lhes convém; No meu cantinho, eu permaneço tão sozinho, No abandono, sem ter sono, sem ninguém”. ....................................................................... Ontem à tarde, um Jasmim contou pra mim: “-A Violeta vai casar-se, até que enfim!.. Pra quem dizia que ela ia ser “titia”... Desencantou, despetalou, engravidou! A Trepadeira, ah, quem diria... virou freira; Passa os dias, passa as noites, a rezar; A Dália quer casar, véu, grinalda, na igreja; Não importa o noivo, pode ser qual flor que seja. Que houve com as flores, hoje tão discretas, Tem mil pudores, viçam tão quietas?... Quando é tarde, a noite vem, já estão dormindo, A sonhar, num sonho lindo, com alguém. Tão sozinho, eu continuo em meu cantinho, Sem ter sono, no abandono, sem ninguém”.

04/04/2007

“Peça”



A nossa vida é uma peça, um ato por dia;
Nove meses encenados num palco escuro...
E, nele, começando a carreira, inseguro,
Um ator apenas, numa casa vazia.

Sem a ribalta, sem aplausos, nem platéia,
O anônimo artista segue representando...
E todas as cenas são mudas, até quando,
Anunciarem um novo teatro, nova estréia.

Vão vir então apupos, e ovações, à beça,
Espectadores a confundir-se, milhares,
Com milhares de atores, numa mesma peça...

Dará prazer, às vezes ódio, estar em cena;
Nós seremos o alvo de inúmeros olhares...
Uns serão de aprovação, e uns outros, de pena!