21/03/2009

“Senectus”

“-Ó maldita “Senectus”, o meu rosto engelhas!...
Ouve, por um momento só, as minhas queixas;
Por que tu não deténs teu curso, não me deixas,
Não vês que a um deserto, de tal modo o assemelhas?

Não me venhas falar de desígnios divinos,
Tal desculpa não quero ouvir, não me convences;
Melhor, que bem depressa, noutra esquiva penses,
Ou nalgo que abrande teus modos tão ferinos.

Se má impressão meu rosto causa, é culpa tua,
Se dele riem, toda vez que eu saio à rua,
És a culpada, tu bem sabes, não me negues.

Se a mim tu impões cada vez mais, tanto rigor,
De minha amada, aqui te imploro, por favor:
Ao menos, pra bem longe, os teus cinzéis carregues!...”
“A mesma frase”

Vejo, nos teus olhos, um doce encantamento,
E sinto, igual fascínio, vês nos meus também;
Me faz acreditar que os nossos olhos têm,
Nas íris, espelhado, um mesmo sentimento.

Um desmedido amor que nunca se declara;
A timidez aquieta sempre a nossa voz;
Tantos desejos vive a despertar em nós,
Assim, tão brilhante, qual mística almenara.

Todo esse medo, um dia, sei, vai se extinguir,
E vamos juntos nossos corações abrir,
Deixando que a paixão contida neles, flua.

E, num momento indescritível de emoção,
De minha boca irás ouvir: -“Eu te amo!”, então,
E a mesma frase eu vou, feliz, ouvir da tua!
“O beija-flor e a rosa”

Todas as manhãs, ao romper da aurora,
Invade o meu jardim, um beija-flor;
E ao vê-lo, esvoaçante, multicor,
Emocionada, vibra toda a flora.

Quão lépida e galante essa avezinha,
No afã de o doce néctar vir sorver;
Um misto de euforia e de prazer
Nas flores, ao beijá-las, adivinha.

Mas sempre ocorre, de forma curiosa,
Que ele mais se demora numa rosa,
E assim todo o jardim já percebeu.

E ali, envolto em sonho singular,
Penso em nós dois, e fico a imaginar:
Que tu és a rosa... O beija-flor sou eu!...

13/03/2009

“Grito contido”

Há um grito preso na minha garganta,
Que eu tento a todo custo sufocar;
Às vezes ele insiste, e isso me espanta;
Vem a vontade louca de gritar.

Minh’alma, temerosa, treme inteira,
Como se a dor do mundo fosse a minha;
E sofre toda vez, desde a primeira,
Quando a fuga do grito se avizinha.

Há uma tristeza nela enclausurada,
Que foi chegando, assim, desavisada,
E desabou tal qual os temporais.

Eu vivo temendo que ela transborde,
E que ao gritar, a cidade inteira acorde...
Não mais adormeça ao som dos meus ais!
“Estrela... Mulher?...”

Toda estrela que vejo faz lembrar,
Tua resplendência, teu místico encanto;
O intenso brilho que trazes no olhar,
Ao delas, creia, se parece tanto!

Que, às vezes, penso no infinito vê-la,
Entre os astros, esplêndida, fulgindo;
Chego a pensar, de fato, que és estrela;
Pra nos encantar, à Terra tens vindo!

Se és mulher, se és estrela, já nem sei,
Eu só posso dizer que me encantei,
Ao te ver no céu, ao te ver aqui...

Pois, se és estrela, muito me fascinas,
Sendo mulher, confesso, me alucinas,
Que na dúvida ficar, decidí!...
“A princesa”

Tu és a princesa dos contos de fada,
Que lia encantado quando era criança;
Depois de tanto tempo, ainda guardada,
Tão linda, viva, na minha lembrança.

E quando te via por mim passar,
A mesma princesa, confesso, eu via;
Jamais eu pensei, tão real, encontrar,
A bela jovem dos contos que eu lia.

Mas sempre, me lembro, confuso estava;
E pra mim mesmo toda vez, dizia,
Ao olhar-me no espelho, pesaroso:

“-Não sou aquele príncipe formoso,
Que inevitavelmente aparecia,
E no final contigo se casava!”...
“Rosas e estrelas”

Que bom foi conhecer-te, certo dia;
Eu nunca me esqueci daquele instante...
Teu perfume de rosas recendia;
Era de rosas, lembro, teu semblante!...

Nos teus olhos, estrelas cintilavam;
Havia estrelas no teu corpo inteiro...
Astros e flores, tanto me encantavam;
Assim era teu brilho, era teu cheiro!...

Hoje, em meu jardim, me lembrei de ti,
Ao ver as rosas que nunca esqueci,
Guardando, zelosas, o teu perfume.

À noite, vendo estrelas, me encantei,
Daquele instante, pronto, me lembrei,
Sentindo renascer o mesmo nume!
“O que importa”

De que matéria tu foste talhada,
Pra ter assim essa imagem divina?...
O rosto, esse corpo que me alucina?...
A um só tempo és mulher, menina, fada!...

No corpo, as formas da Vênus, perfeita,
Na face, a candura de anjos tu tens;
Quem és, criatura, de onde tu vens,
De que elemento ideal foste feita?...

De qual plaga do Universo surgiste?...
Essa tua beleza, de onde trouxeste;
Teu lume candente, de que consiste?...
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Deixemos de lado as indagações:
O que importa de fato é que vieste,
Pra delírio de olhos e corações!...
“Exaltação”
Indescritível... flor, tenra bonina,
De um jardim sobrenatural, surgida;
És falena insinuante, “ballerina”,
À luz das ribaltas de minha vida!...

Irresistível... mulher, atraente,
Em vão, por ti, suspira a natureza,
Ao ver-se pífia, vulgar, descontente,
Ante à lucina de rara beleza!

Inatingível... estrela, deslumbrante,
Que da janela avisto fulgurante,
Em todas as noites no céu em gala...

Que me extasia tanto, me entontece,
Que tão próxima, às vezes, me parece,
Mas não consigo jamais alcançá-la!...
“Um olhar assim”

Olhes pra mim,
Mas olhes sempre com jeito,
Que o teu olhar, parece, foi feito,
Pra me matar.

Olhes pra mim,
Mas sempre olhes com cuidado,
Que eu nunca tinha pensado,
Que havia um olhar assim.

Olhes pra mim,
Mas olhes bem devagar,
Que é pra eu me acostumar,
À luz desse teu olhar.

Olhas pra mim,
Com esse teu olhar tão doce,
Como se, de fato, eu fosse,
Capaz de suportar.

Olhas pra mim,
E toda vez que olhas, vejo,
Aceso, sempre um desejo,
Louco, de incendiar.

Pobre de mim,
Que sempre indefeso sou
Nas vezes em que eu estou,
Na mira do teu olhar.

...Sorte, pra mim,
Que vejo um olhar assim...

Já nem me importa o que ocorra,
Mesmo que o vendo, eu morra...
Morrerei feliz, enfim!
“Presente”


Quisera ter um coração gelado...
Um “iceberg” dentro do meu peito;
Não esse tolo, que vive abrasado,
Que ama demais e nem pulsa direito.

Que presta ao amor extremado zelo,
Se esquecendo até das funções vitais;
Se fosse como eu queria, de gelo,
Cuidaria do meu sangue, bem mais.

Não ficaria alojando emoções...
Ao resfriar o calor das paixões,
Espantaria um amor que chegasse...

Deus, no entanto, quis dar-me de presente,
Bem assim como o que eu tenho, tão quente,
Um que eternamente se apaixonasse!...
“Zero vírgula zero”

Falas de mim com desprezo, tenho notado;
Que se eu morresse não seria grande perda...
À luz da matemática, um zero à esquerda...
Olha, atentamente... e vais te ver do meu lado!

Representamos a falência, a derrocada,
A burra sociedade que a si mesmo anula,
Dois dígitos iguais de uma quantia nula;
Dois tolos figurantes de um valor... que é: nada!

Por me depreciares, de maneira acintosa,
Dar-te uma resposta, nestes meus versos quero,
Haja vista que os manejo bem melhor que a prosa.

Tantas evidências não deixam que eu me cale;
Vejo a nós dois, como zero vírgula zero:
Tu és o da direita, que também nada vale!
“Fragmentos”

Ah!... meus pobres versos!... andam perdidos
No dorso da brisa, vagando a esmo!...
Vão sendo aos sons da noite confundidos;
Ninguém sabe por que... nem sei eu mesmo!...

Quem foi que os pôs assim, brisa, confessa!...
Nessa viagem sem destino, confusa?...
Quem foi que atrapalhou sutil remessa:
Versos encantados pra minha musa?...

Mil versos farei, se tu me ajudares,
Também para ti, de agradecimento,
Se os versos pra ela, acaso encontrares...

Ao tocares neles... peço-te calma...
Pois cada um deles é um frágil fragmento,
Da imensa paixão por ela em minh’alma!...
Que rei sou eu?...



Mas, afinal, que rei sou eu, tão pobre, “duro”?...
Minha coroa não tem ouro, é feita em lata;
Meu castelo não passa de um pardieiro escuro;
O meu cetro é um bastão de madeira barata.

Meu trono é uma cadeira velha, toda torta,
Que mal suporta meu peso, no dia-a-dia...
Veio um surto de gripe, e toda a corte é morta...
...Nem a rainha se livrou da epidemia!...

Meu reino é meu quintal, pequeno e mal cuidado;
(Umas flores, lá inda viçam, teimosamente,
“Protegidas” por uma cerca em mau estado!...)

As razões desse absurdo, confesso, não sei...
Mas prometo aqui: se acontecer novamente...
Farei um esforço sobre-humano, e acordarei!
“Cenário”

Por tantas vezes, lhe abraçar, pensei,
Nesses meus sonhos, tantos, delirantes...
Neles, nem sabes, o quanto eu beijei,
Esses seus lábios rubros, provocantes...

Éramos devassos enlouquecidos,
Em meio a uma permuta de prazeres;
Sussurros, e suspiros e gemidos,
Embalavam ali nossos dois seres.

Por nossas libidos sendo arrastados
Pela noite afora, de tão cansados,
Nem víamos o dia amanhecer...

...Me lembro acordando, tão solitário,
Todas as manhãs, no triste cenário,
Do meu quarto vazio sem você!...